segunda-feira, abril 28, 2008

AMAZÔNIA.

2 Março-Abril 2008 - Military Review
Artigo publicado na revista PADECEME do Exército Brasileiro, 2ª quadrimestre, 2006
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O presente artigo tem por finalidade apresentar uma real ameaça à soberania nacional e à integridade territorial, na Amazônia Brasileira, caso o Brasil não reverta suas vulnerabilidades naquela região.
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A documentação que trata da defesa nacional considera como sendo difusas as ameaças que hoje poderiam afetar o Brasil, o que exige o preparo de nossas Forças Armadas (FA) calcado em capacidades para atuar em diferentes cenários de conflitos.
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O preparo com base em capacidades para desafios distintos faz sentido. Porém, há que se estabelecer uma diferença entre desafios (ou problemas) que afetam a segurança nacional, mas que o País pode neutralizar com recursos próprios de qualquer campo do poder nacional; e ameaças que coloquem em risco a integridade territorial e a nossa soberania, quando o Estado não dispuser de meios suficientes para dissuadir o(s) oponente(s).
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As chamadas “novas ameaças”, dentre elas, delitos “transnacionais”, terrorismo internacional e perda de autoridade do Estado-Nação, estão dentro do universo de desafios/problemas, mais do que, propriamente, do espectro de ameaças.
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General-de-Brigada R1 Luiz Eduardo Rocha Paiva, Exército Brasileiro
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Amazônia:

Vulnerabilidade – Cobiça – Ameaça
(Comando Militar da Amazônia - CMA)
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Military Review - Março-Abril 2008 3
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Amazônia
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Por outro lado, a cobiça internacional pelos recursos da Amazônia Brasileira caracteriza uma real ameaça à soberania e à integridade territorial, uma vez que envolve interesses que poderão ser vitais para grandes potências.
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Se a Nação não compreender isto, claramente, continuará a criar, ela própria, as condições objetivas para a ingerência internacional, no sentido de impor uma soberania compartilhada na região.
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A sociedade precisa conhecer o risco que envolve não povoar, não desenvolver, não integrar, não defender e não preservar a Amazônia, pois só assim passará a exigir medidas preventivas, contrapondo-se a diversos atores adversos.
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Um dos motivos principais da falta de recursos para as FA é a crença equivocada do brasileiro em que o País não tem ameaças, fruto de nossa incapacidade de antevê-las, por falta de visão estratégica.
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A Vulnerabilidade
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A Amazônia Brasileira é um imenso espaço rico em recursos e vazio em termos de população, agências e órgãos do Estado.
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É comum Organizações Não Governamentais (ONG ) ocuparem os espaços que cabem ao Estado Brasileiro, sendo que muitas destas organizações representam, “veladamente”, interesses internacionais públicos ou privados.
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Várias ONG não têm nenhum compromisso com o Brasil e atuam no sentido de que os indígenas, no futuro, constituam “nações autônomas”.
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A região amazônica brasileira é um espaço inserido em nossas fronteiras, mas ainda não foi efetivamente ocupado e integrado à Nação.
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Fica, assim, caracterizada uma vulnerabilidade pelo vazio de poder, ausência do Estado e baixo grau de integração, tudo associado aos imensos recursos, a médio prazo, escassos para o mundo, e à cobiça internacional perfeitamente identificada.
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O Interesse Internacional
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Em 1850, o Comandante Matthew Maury, Chefe do Observatório Naval de Washington (EUA), defendia a livre navegação internacional no Rio Amazonas, considerando que o rio deveria ser incorporado ao status do Direito Marítimo.
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Em 1902, em Berlim (Alemanha), o Chanceler alemão – Barão Oswald Richtöfen – propunha que “seria conveniente que o Brasil não privasse o mundo das riquezas naturais da Amazônia”.
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Em 1989, Al Gore, ex Vice-Presidente dos Estados Unidos da América (EUA) disse: “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”.
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No mesmo ano, o Presidente da França, François Mitterrand declarou: “O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia”.
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Em 1990, em um Congresso de Ecologistas Alemães, foi acordado que “a Amazônia deve ser intocável, pois se constitui num banco de reservas florestais da humanidade”.
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Em 1992, o Conselho Mundial de Igrejas Cristãs expressou, nas diretrizes para seus missionários na Amazônia, que: “A Amazônia total, cuja maior área fica no Brasil, mas que também compreende os territórios da Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, é considerada por nós como um patrimônio da humanidade. A posse dessa imensa riqueza pelos países mencionados é meramente circunstancial.”
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Ainda em 1992, o ex Primeiro Ministro da Inglaterra, John Major, declarou que: “As nações desenvolvidas devem estender o domínio da lei ao que é comum a todos no mundo".
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As campanhas ecologistas internacionais sobre a região amazônica estão deixando a fase propagandística para dar início a uma fase operativa, que pode, definitivamente, ensejar intervenções militares diretas sobre a região”.
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Cabe chamar a atenção sobre o ano (1992), em que foi dada a declaração supracitada. Foi o ano da ECO-92 – convenção internacional sobre o meio ambiente, no Rio de Janeiro. Naquela ocasião, foi estabelecida a Reserva Indígena Yanomani, que desencadeou o processo de criação de grande parte das Terras Indígenas (TI ) que, hoje, são cerca de 12% do Território Nacional. São conhecidas as fortes pressões sofridas pelo Brasil para a adoção daquela medida.
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Em 1998, Patrick Hugles, Chefe do Órgão Central de Informações das FA dos Estados Unidos, em palestra realizada no Instituto de Tecnologia Massachusetts disse: “caso o Brasil resolva fazer um uso da Amazônia que ponha em risco o meio ambiente nos EUA, temos de estar prontos para interromper esse processo imediatamente”.
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Em 2005, Pascal Lamy, Diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, manifestou que: “A Amazônia e as outras florestas tropicais do planeta deveriam ser consideradas bens públicos mundiais e submetidas à gestão coletiva – ou seja, gestão da comunidade internacional”.
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É uma extensa lista de autoridades, às quais poderíamos acrescentar: Henry Kissinger; Margareth Thatcher; e Gorbachov, que também manifestaram publicamente o mesmo pensamento.
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Existem grupos internacionais – empresas, laboratórios, indústrias e ONG de “fachada”, que já estão presentes, ou desejam estar, pesquisando e explorando a região sem controle do Estado, transferindo para o exterior recursos e conhecimentos em detrimento do Brasil.
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O imenso potencial de nossas riquezas e sua escassez a médio prazo são razões suficientes para as pressões internacionais, no sentido de impedir que o Brasil explore seus recursos, mantendo-os intactos para o uso de outros atores no futuro.
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Fica, assim, caracterizado o interesse internacional, particularmente de potências, em região tão rica e vulnerável de nosso País.


Temas da “Agenda Internacional”

Existem alguns temas da chamada agenda mundial que estão relacionados mais diretamente com o problema, aconselhando uma atuação próativa e permanente do Estado.
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Assim, evita-se que eles venham a ser usados como pretexto para respaldar pressões internacionais, que recebem, muitas vezes, o apoio de pessoas e organizações do País, agindo por convicção ou fazendo o jogo de interesses estrangeiros.
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Destacam-se, a seguir, três temas que merecem atenção especial do brasileiro.
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A questão ambiental.
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É necessário um rigoroso controle da ocupação, exploração e desenvolvimento da região, no sentido de coibir crimes ecológicos e preservar o meio ambiente, neutralizando campanhas extremistas contra o desenvolvimento sustentável da região.
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Pública.
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Reforçar o controle da faixa de fronteiras e do espaço aéreo, bem como coibir a violência rural, neutralizando o poder do crime organizado e de outros bandos armados que atuam, ao arrepio da lei, infiltrados em grupos de interesses opostos que se enfrentam na região.
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A questão indígena.
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Revitalizar a política de integração do indígena brasileiro. A preservação de seu folclore e de suas tradições não é incompatível com o estudo e com a adoção de novos hábitos. Como aceitar que um ser humano, que vê uma televisão, um avião, um computador e outros meios que dão mais conforto, bem-estar e saúde, fique estagnado na “idade da pedra”? Os descendentes de japoneses, europeus e africanos conseguem manter seus laços culturais, sem deixar de desfrutar das benesses do progresso.
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A partir de 1992, houve um acréscimo importante na criação de TI e unidades de conservação (UC). Hoje, estas áreas correspondem à extensão territorial da Alemanha e França reunidas, perfazendo 12% do território nacional.
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A população indígena brasileira está em torno de 400 mil índios.
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Se analisarmos o Estado de Roraima, destaca-se que 60% de seu território são constituídos de TI . Tal fato poderá inviabilizar seu desenvolvimento e, paulatinamente, causar o esvaziamento populacional. Simultaneamente, pode-se prever o crescimento da população indígena nas TI , onde estão sob forte influência de ONG , várias sem nenhum compromisso com o Brasil. Para ONG desta natureza e para muitos organismos internacionais, estes índios não são cidadãos brasileiros e se constituem em “nações”. O mais grave é que existem brasileiros e movimentos nacionais que pensam igual.
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A história recente nos mostra a Questão do Kosovo (Sérvia), onde o paulatino esvaziamento da região pelos sérvios e o crescimento da população albanesa criaram um fato consumado, que levou à perda da soberania plena, pela Sérvia, sobre aquela parte de seu território.
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Houve intervenção militar violenta de potências estrangeiras, com o aval de organismos internacionais de segurança.O arco fronteiriço do Bras il na região amazônica está pleno de TI e UC, o que dificulta a vivificação de nossas fronteiras, mantendo-as como espaços abertos e difíceis de controlar e defender.
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O cenário aqui descrito de maneira sucinta foi estabelecido pelo próprio País, muitas vezes sob pressões internas e externas. Conclui- se que a cons trução de tal cenário potencializou as vulnerabilidades já comentadas.
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Soberania Compartilhada
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Um vazio de poder como o que constatamos na Amazônia não será permanente. Será ocupado pelo Brasil ou por outra potência, coalizão ou organismo internacional (OI).
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A soberania compartilhada não implica, necessariamente, em invasão, conquista e ação militar direta em toda região.
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A pressão internacional em todos os campos do poder, com apoio de setores nacionais (“inocentes úteis”?), vem comprometendo nossa soberania na região, particularmente a partir do início da década de 1990, por meio de “ações sucessivas”. Poderá chegar o momento em que estarão estabelecidas as condições objetivas para uma “declaração” – de potência, coalizão ou OI – tentando impor a Soberania Compartilhada.
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Tais condições podem estar sendo delineadas em Roraima, por exemplo, pelas razões já comentadas, agravadas, ainda, pela sua posição geográfica menos protegida. Seria um precedente perigoso, pois poderia motivar questões de revisão de tratados de limites do País e a reação violenta de parcela ponderável de brasileiros que não aceitariam tal imposição.
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Não é previsível uma invasão total da região, pois seria praticamente inviável. Soberania Compartilhada deve ser entendida, neste trabalho, como a posse nominal pelo Brasil, que arcaria com o ônus da administração e desfrutaria apenas de parte do bônus das riquezas, ficando o grosso destas com a “comunidade internacional”, leia-se as potências.
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Integração da América Latina,
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Onde se Insere a América do Sul
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Trata-se de um dos objetivos nacionais, como consta no Art 4º, do Título I da Constituição Federal.
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O Brasil tem importante papel a desempenhar nessa integração, pela sua posição geopolítica decisiva no Prata e na Amazônia. No que diz respeito ao norte da América do Sul, a Amazônia Brasileira é o amálgama que unirá os países condôminos.
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Se o Brasil não exercer soberania plena sobre sua região amazônica, não terá um papel decisivo neste processo de integração, o qual poderá não se concretizar ou ser conduzido por outro ator.
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A Capacidade de Dissuasão Militar
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Não se visualiza sua concretização a médio prazo, pois não são destinados recursos suficientes para o reaparelhamento das FA, não há um projeto de reativação da indústria de defesa e o País tem sofrido pressões internacionais, com prejuízo de seu pleno desenvolvimento científico e tecnológico.
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O material de emprego militar em nossas FA é quase todo importado, no que tange aos equipamentos e armamentos decisivos em uma campanha. Assim, somos dependentes da vontade alheia para nos mantermos em operações de longo prazo. Esta situação amplia nossas vulnerabilidades, aqui considerado o campo do poder militar. A capacidade de dissuasão militar diante de potências mundiais, ou de organismos de segurança coletiva, está longe de se tornar efetiva.
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Deve-se ter em mente que a defesa da “Amazônia Verde” começa na “Amazônia Azul” e o espaço aéreo. A concretização de um interesse estrangeiro na “Amazônia Verde” será buscada mediante pressão em pontos sensíveis do território nacional no Sul, no Sudeste, na plataforma marítima ou no Planalto Central. Daí, a importância, também, do fortalecimento dos poderes naval e aeroespacial.
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Fica no ar um questionamento. Como pensar que uma sociedade carente de recursos em diversos setores vai concordar em empregar parte dos mesmos para estabelecer a capacidade de dissuasão, que julgamos importante, se nós não formos capazes de mostrar-lhe a necessidade de fazê-lo? Se não lhe deixarmos claro contra o que ela deve ter tal “seguro devida”?
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Caracterização da Ameaça
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Definidas as vulnerabilidades e o interesse internacional na região amazônica, pode-se caracterizar a seguinte situação com potencial para gerar uma crise: Um Cenário Possível a Longo Prazo.
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Os recursos existentes na Amazônia passam a ser escassos no mundo e se tornam interesses vitais, particularmente para as potências, como são os do Oriente Médio na atualidade.
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Potências, coligadas ou não e com ou sem o aval de organismos internacionais, pressionam ostensivamente o Brasil nos campos político, psicossocial, econômico e científico-tecnológico, a fim de serem atendidas em seus interesses (Estratégia Indireta).
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O governo resiste às pressões que comprometem a soberania e passa a sofrer sérios boicotes impostos pelos atores interessados, os quais passam a ameaçar militarmente, de ocupação, bloqueio ou destruição, áreas estratégicas sensíveis do território nacional, não necessariamente na Amazônia, escalando a crise e agravando as pressões (Estratégia Direta).
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As “justificativas” dos atores oponentes ao Brasil são calcadas nas questões do meio ambiente, da proteção ao indígena, do controle dos ilícitos transnacionais e das “necessidades da comunidade mundial”, que camuflam os verdadeiros motivos.
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Este quadro adverso é o desfecho possível da ameaça que está sendo configurada há cerca de 15 (quinze) anos, por meio de ações sucessivas, que vêm limitando a soberania do Brasil na Amazônia. O País precisa reverter suas vulnerabilidades na região e na capacidade de dissuasão militar, para não dar margem à concretização final da ameaça aqui caracterizada.
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O Caminho de Volta
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Como se vê, já foram dados vários passos importantes no aproveitamento e agravamento de nossas vulnerabilidades na Amazônia.
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O Brasil precisa reaprender a pensar estrategicamente e antever ameaças para neutralizá-las oportunamente, bem como ter o cuidado de não adotar, no presente, medidas que serão exploradas contra nossos próprios interesses, no futuro, em conflitos que, com certeza, vamos enfrentar.
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Quem espera “ver para crer” em uma ameaça não age com oportunidade e pagará um preço alto por não ter sido previdente. Quando for reagir, será tarde demais e não estará preparado.
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À atual situação, devemos fazer o “caminho de volta”, também, com “ações sucessivas”, desenvolvendo um Projeto de Integração da Amazônia, com características como, dentre outras:
• alcance e conscientização nacionais;
• visão de futuro definida em todos os campos do poder;
• controle das ONG e de outros atores, particularmente estrangeiros, que atuam na região;
• apoio ao Programa Calha Norte;
• ações estratégicas e metas, sucessivas e paulatinas;
• revisão de políticas atualmente em vigor;
• definição de pólos de desenvolvimento e infra-estrutura de apoio, com os incentivos correspondentes;
• focos no desenvolvimento, com preservação ambiental, e na ocupação e vivificação, com proteção às populações indígenas; e
• vontade nacional para enfrentar reações internacionais com altivez e dignidade (choque de civismo e valores).
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O Projeto poderia ser conduzido por um Ministério da Amazônia e seu foco estaria mais voltado para os campos político, econômico, psicossocial e científico-tecnológico do que para o militar, pois naqueles setores estão nossas vulnerabilidades mais prementes. A implementação do Projeto por ações sucessivas, paulatinamente, é um cuidado para restringir as reações internacionais que vão se fazer presentes.
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Conclusão
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“A arte da guerra nos ensina a confiar não na probabilidade de o inimigo não vir, mas em nossa própria prontidão para enfrentá-lo; não na eventualidade de ele não atacar, mas, antes, no fato de tornarmos nossa posição inexpugnável” Sun Tzu.
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Creio ter ficado claro que existe uma ameaça concreta à nossa soberania e integridade territorial. Ela é fruto de vulnerabilidades, do interesse internacional, da falta de visão prospectiva pelo Brasil, da demora na integração de um importante espaço vital e de nossa fraqueza militar.
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Tal ameaça vem sendo construída há cerca de 15 (quinze) anos. Há condições para reverter a tendência à sua concretização, porque as áreas estratégicas onde as potências estão engajadas, prioritariamente, não se situam na América do Sul, porque o Brasil tem demonstrado possuir capacidade de superar desafios e porque temos tempo, por enquanto, para agir.
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Falta perceber (antever) e compreender o real significado e o perigo da ameaça. Há que se ter cuidado com a supervalorização do conceito de “novas ameaças”, pois pode nos conduzir ao desvio de nosso adestramento e da construção de nossa capacidade de dissuasão militar. Tal conceito, relativamente novo, parece atender ao objetivo manifestado por potências, no início da década de 1990, de mudar a destinação das FA de países em desenvolvimento, particularmente na América Latina.
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Defendendo na terra o domínio do ar. 11 DEZ - Dia da Infantaria da Aeronáutica
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FONTE: REVSITA MILITARY REVIEW

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